La Niña está a caminho após El Niño intenso
Após um El Niño excepcionalmente forte, responsável por elevar significativamente as médias globais de temperatura, o fenômeno La Niña se aproxima. Apesar de seu comportamento oposto, que esfria as águas do Pacífico, especialistas alertam que ele não deve aliviar as temperaturas globais e pode até persistir por anos, agravando os efeitos das mudanças climáticas.
De acordo com a Organização Meteorológica Mundial, com o declínio do El Niño, há 70% de chance de que La Niña se estabeleça entre agosto e novembro. No entanto, essa mudança não deve diminuir o aquecimento global.
“O fim do El Niño não significa uma pausa nas alterações climáticas a longo prazo, uma vez que o nosso planeta continuará a aquecer devido aos gases com efeito de estufa, que retêm o calor,”
afirmou o secretário-geral da instituição, Ko Barrett.
O que causa La Niña?
A manifestação de La Niña ocorre pelo mesmo mecanismo que o El Niño.
“A La Niña acontece quando os ventos alísios se intensificam, deslocando a camada superficial de água quente do Pacífico e, consequentemente, promovendo seu resfriamento,”
explica Regina Rodrigues, professora de Oceanografia e Clima da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Coordenadora dos Grupos de Trabalho sobre Risco Climático e Ondas de Calor Marinhas do Programa Mundial de Pesquisas Climáticas da ONU, em entrevista à VEJA.
Os ventos alísios são massas de ar que se deslocam de forma persistente dos trópicos para o equador. Quando esse evento diminui, as águas no Pacífico ficam acima da média, resultando no El Niño. Por outro lado, quando a corrente se intensifica, as temperaturas diminuem, levando ao fenômeno oposto.
La Niña vai diminuir o calor?
No Brasil, a principal consequência de La Niña é nos extremos do país.
“O fenômeno causa secas na Região Sul e aumenta a intensidade das chuvas na Região Norte, às vezes atingindo também parte do Nordeste,” explica Rodrigues.
Embora La Niña cause uma diminuição na temperatura média global, a especialista alerta que não haverá uma redução nas temperaturas no Brasil.
“Como La Niña afeta a temperatura do Pacífico, que ocupa uma grande área do globo, a média diminui, mas localmente o efeito não é esse,” diz Rodrigues.
“O que vai acontecer, na verdade, é um aumento das temperaturas no Sul, já que, sem nuvens no céu, existe um aumento da incidência de radiação solar na região.”
Como as mudanças climáticas vão afetar La Niña?
Durante o El Niño, muito se discutiu sobre a convergência entre os efeitos do fenômeno natural e do aquecimento global, intensificando os eventos extremos decorrentes das mudanças climáticas. Durante La Niña, essa interação não será diferente.
Segundo a especialista, embora a intensidade de La Niña não varie tanto quanto seu contraponto, as mudanças climáticas podem prolongar a duração do fenômeno.
“Nós vimos isso no último La Niña, que durou de 2020 a 2022, causando seca e um prejuízo de mais de 70 bilhões de reais para o agronegócio no Sul,” diz Rodrigues.
Ainda não é possível prever quanto tempo La Niña vai durar, mas se prolongar, como da última vez, os efeitos mais intensos serão observados especialmente no Rio Grande do Sul. Isso ocorre porque, além da estiagem, o estado também pode enfrentar recordes de temperatura causados pela maior incidência de radiação solar, em combinação com os efeitos do aquecimento global. As chuvas intensas e prolongadas também podem causar transtornos na Região Norte.
E o resto do país?
Segundo os especialistas, os efeitos dessa gangorra climática — que tende a se tornar mais constante devido às mudanças climáticas, sem os clássicos períodos de neutralidade — são mais proeminentes nas bordas norte e sul do país. Enquanto isso, no centro do Brasil, os extremos climáticos são predominantemente causados pelo aquecimento global, com pouco efeito de El Niño ou La Niña.